quarta-feira, 1 de abril de 2009 | Autor:

 

Na Índia, os mágicos pertencem a uma sub-casta específica e seus truques vêm sendo ensinados de pai para filho há centenas de anos. Graças a isso, desenvolvem sua arte até às raias do impossível. E fazem-no sem nenhum recurso tecnológico, pois exercem na rua, no chão de terra, onde não há possibilidade de truques com espelhos ou fundos falsos.

Em uma das viagens, nosso grupo foi abordado na rua por um desses mágicos, que logo propôs:

– Se não gostarem não precisam pagar.

Aceitamos, mesmo sabendo que acabaríamos tendo que pagar de qualquer jeito. Sentamo-nos em círculo e ele no meio. Começou com o truque elementar das três cabaças e uma bolinha de pano, para que a assistência adivinhasse sob qual delas estaria a bolinha. Mostrou as cabaças e a bolinha. Todos as examinaram. Ele colocou a bolinha sob uma das cabaças e as embaralhou propositadamente devagar, sobre o chão de terra, na rua. Quando achou que bastara de movimentar as peças, perguntou:

– Onde está a bolinha?

Todos apontaram para a mesma cabaça, pois ele embaralhara tão lentamente que era fácil acertar. Ele levantou a cuia e… não estava lá! Olharam dentro da cabaça. Não estava mesmo. Bem, quem sabe, nesta outra? Também não. Então, tem que estar nesta última. Mas… também não estava! Ele explodiu numa sonora gargalhada. Olhou para o vento e invocou:

– Charlie!

Voltou-se para nós e mandou que recolocássemos, nós mesmos, as cabaças emborcadas no chão e as embaralhássemos. Aí levantou a primeira: a bolinha estava lá! Com um sorriso maroto levantou a segunda: também havia uma bolinha ali. Levantou a terceira: também estava lá. Outra gargalhada. E outra invocação ao vento:

– Charlie!

Mandou que puséssemos as três bolinhas sob uma só cabaça e embaralhássemos. Ficamos de olho. Ele foi direto nela. Levantou-a: não havia nada ali. Levantou a segunda: lá estavam as três. Levantou a terceira: rolaram tantas lá de dentro que depois foi impossível recolocá-las, pois não cabiam mais no mesmo espaço!

Era impossível. Não havia mangas, nem fundos falsos. Era dia claro e estávamos todos em torno dele, à frente, atrás, dos lados, com espertos olhos, observando atentamente. Pedíamos que repetisse e olhávamos todos juntos, bem de perto. Nada. O truque era mesmo perfeito.

Pegou uma bolinha e pôs na boca. Quando a retirou ela estava em chamas. Truque barato. Então soltou a fumaça que havia ficado na boca. Em seguida mais fumaça. E mais. E mais, mais, muito mais. Ficamos envoltos em fumaça saída da boca do mágico, como se ele fosse um dragão com dispepsia. Que truque poderia fazer aquilo acontecer diante dos nossos olhos?

Alguém lembrou-se de advertir:

– Cuidado com as carteiras e passaportes, que podem aproveitar o fog para fazer a limpa!

Aí, ele tirou uns pregos tortos e enferrujados de dentro da boca. A essa altura já não nos impressionávamos com isso. Mas ele começou a regurgitar uma quantidade enorme, infindável, de pregos enferrujados e secos. Sim, secos, sem um mínimo de suco gástrico. Não podiam estar vindo do seu estômago.

Depois, mandou que déssemos um nó num lenço. E que cada um puxasse de um lado para que ficasse bem apertado. Pegou o lenço numa extremidade, sacudiu-o e… o nó sumiu.

Após uma variedade de truques sofisticados, mandou que cada um de nós pensasse num perfume e em seguida friccionasse o dorso das mãos e cheirasse. Quem pensou em rosa, lá estava esse perfume. Quem pensou em jasmim, lá estava ele. Quem pensou sândalo, lá estava sândalo. Para nos precavermos contra a possibilidade de alguma hipnose coletiva, cada um cheirou a mão do outro sem saber em que perfume ele havia pensado. E constatamos: o perfume estava lá e conferia.

Sempre antes de cada fenômeno ele invocara o tal de Charlie. Então, contestamos:

– Assim não vale. Você disse que era mágico. Usando poderes paranormais e invocando o elemental Charlie, é fácil. Isso não é mágica: é siddhi.

Ele respondeu:

– Se me pagarem mais vinte rupias eu ensino o truque e aí vocês vão constatar que é ilusionismo.

Pagamos e constatamos. Era mesmo truque!

Já imaginou se um desses prestidigitadores quisesse fazer-se passar por Mestre espiritual, usando seus “poderes” para convencer as pessoas? É o que ocorre com muita frequência, tanto na Índia, quanto no Ocidente.

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