Ser sutil é reconhecer um erro que lhe tenha sido apontado por outrem, até mesmo quando você discordar e achar que está com a razão. Tenho alguns amigos, excelentes pessoas, mas que estão o tempo todo na defensiva. Jamais escutam e jamais aceitam. Precisam justificar-se sempre.
Onde há sutileza, em geral, há boa educação. Sutileza tem a ver com polimento, refinamento.
Sutileza na maneira de segurar uma xícara, um copo, um garfo. Sutileza na forma de sentar-se no sofá sem se atirar nele ou de se virar na cama sem disturbar o parceiro que lá está. Sutileza na maneira de tocar pessoas e objetos. Sutileza na forma de fechar o porta-malas do automóvel de um amigo. Sutileza na hora de repor as coisas exatamente no lugar de onde as tiramos, na casa dos outros, por mais íntimos que sejamos. Sutileza na hora de selecionar as amizades e as pessoas com quem vamos envolver-nos afetivamente. Sutileza na maneira de reclamar ou na forma de dizer uma verdade.
Não há nada mais agradável que poder dizer a alguém:
– Não sei se eu gostaria disso.
E o outro compreender que você não quer isso de maneira nenhuma, não insistir e não perguntar por quê. Já imaginou se, para obter esse resultado, você precisasse dizer:
– Olha aqui, meu amigo. Eu não estou a fim, está me entendendo? Pare de insistir.
E, pior, se o espécimen de Homo sapiens não compreendesse palavras e você precisasse apelar para a força física a fim de ser respeitado! Por exemplo, tendo que trancar à chave um aposento para que o humanóide entendesse que não é para entrar! Certa vez, tive uma secretária que não respeitava a porta fechada da minha sala. Tinha que estar chaveada ou ela irromperia pela minha intimidade adentro.
Creio que pela comparação com os opostos o conceito de sutileza e seu valor ficam mais claros, não é?
Se o adepto da tribo clean for convidado para almoçar ou jantar na casa de alguém, é sua obrigação relembrar o anfitrião de que o invitado não come carne de boi, nem carne de ave, nem carne de peixe, nem qualquer outro tipo de cadáver.
Mais vale informar isso antes do que gerar constrangimento depois. Se lhe desfecharem a famigerada pergunta: “Mas, então, o que é que você come?”, ofereça-lhe um livro Método de Boa Alimentação, deste autor. Tenha sempre um exemplar à mão para poder sacar rápido.
Se, após os cuidados mencionados, os anfitriões tiverem a deselegância de lhe servir animais mortos, você não estará sendo grosseiro se recusar tais alimentos. Deve seguir conversando alegremente, mantendo a simpatia, mas, simplesmente, não tocar na comida. Caso o anfitrião questione por que não está comendo, é adequado ser sincero e dizer:
— Não se preocupe comigo. Como lhe informei anteriormente, eu não como nenhum tipo de carne, nem carne de ave, nem carne de peixe. Mas tenho a certeza de que há legumes nos acompanhamentos e vou me servir deles. Além do mais, estou aqui para desfrutar da sua companhia e isso é o que importa.
Se o equívoco ocorrer num restaurante, após você ter deixado bem claro suas preferências alimentares, não brigue, não faça escândalo (eu sei que dá vontade), não humilhe o pobre diabo que não teve Q.I. para compreender o que você especificou. Peça a conta, pague e vá embora. Você não vai ficar mais pobre por isso, mas garanto que se estiver acompanhado, sua companhia vai ficar muito bem impressionada.
Caso o garçom ou maître lhe pergunte porque não está satisfeito, explique falando baixo, com educação, mas com convicção. Se ele lhe oferecer para trocar o prato, recuse gentilmente. Nunca mande voltar um pedido. É praxe dos cozinheiros do mundo todo cuspir no prato seguinte. Claro que nem todos têm tal comportamento, mas você vai querer arriscar?
Observe que raríssimas são as pessoas que estão satisfeitas com seus mundos. Em geral, todos têm reclamações do seu trabalho, dos seus subalternos e dos seus superiores; da sua remuneração e do reconhecimento pelo seu trabalho; reclamações dos seus pais, dos seus filhos, dos seus cônjuges, do seu condomínio, do governo do seu País, do seu Estado, da sua cidade, da polícia, da Justiça, do departamento de trânsito, dos impostos, dos vizinhos mal-educados, dos motoristas inábeis, dos pedestres indisciplinados… Quanta coisa para reclamar, não é?
Assista ao vídeo ou acompanhe no podcast o desenrolar deste assunto:
Definitivamente, é preciso muita coragem e dignidade para assumir a sua própria culpa e, muito mais, a de outrem. Isso foi o que fizeram inúmeros santos e heróis nacionais, pessoas com um elevado sentido de compromisso humanitário a ponto de sacrificar o próprio ego e, às vezes, até a vida.
Mas antes de utilizar a estratégia do pedido de desculpas, é preciso eliminar o sentimento de culpa típico das ex-colônias. Na América Latina diz-se o “desculpe-me” com humildade e inferioridade, enquanto que nos países colonizadores utiliza- se esse termo como recurso de superiorizar-se em relação à pessoa com quem se fala.
Na França aplica-se o “pardon M’sier” para chamar a atenção de alguém que tenha sido indelicado ou que tenha procedido mal em qualquer circunstância.
Na Inglaterra e outros países que falam dialetos do inglês, usa-se a forma “I beg your pardon” (eu suplico o seu perdão) para fazer uma admoestação com superioridade e elegância a quem tiver cometido uma falta, uma arrogância ou impertinência.
Em ambos os casos a pessoa que pediu perdão fê-lo de cabeça erguida, com atitude de quem estava acima do outro. Com o pedido de perdão rebaixou o interlocutor, obrigando-o a responder com uma justificativa. No caso do inglês, a pessoa fica instada a modificar sua frase anterior. Se ela havia dito, por exemplo: “O senhor retirou o objeto que estava aqui”, o “I beg your pardon” tem o poder de modificar a atitude do acusador para algo como: “Sinto muito, o que eu quis dizer foi que o senhor pode inadvertidamente ter esbarrado e deixado cair o objeto em questão”. Você nota uma flagrante diferença de postura no pedido de perdão do colonizador e no do colonizado.
Como estou lidando com um leitor que já é viajado e cosmopolita (se ainda não o é, passará a ser com a leitura dos meus livros), posso propor que assuma a postura de elevada auto-estima ao aplicar a estratégia do pedido de desculpas. Ao fazê-lo, você não estará se humilhando nem se rebaixando, mas estará pensando consigo mesmo: “Controlei a situação e dominei esse bruto que tenho diante de mim. Estou satisfeito por ter conseguido fazê-lo com uma inteligente administração de recursos. Na relação custo/benefício, poupei tempo, economizei stress e ainda contabilizei uma pessoa que pode vir a ser útil no futuro.”
A maior parte das normas de conduta surgiram de razões práticas. Se você conseguir descobrir o veio da consideração humana, terá descoberto também a origem de todas as fórmulas da etiqueta.
Tudo isso se resume a uma questão de educação. Boas maneiras são as maneiras de agir em companhia de outras pessoas de forma a não invadir seu espaço, não constrangê-las e fazer com que todos se sintam bem e à vontade na sua presença. Por isso, boas maneiras são uma questão de bom senso.
Já vi muita gente declarando: “Fulano não serve para ser meu amigo. Vou lhe dizer umas poucas e boas.”
A sabedoria popular diz que mexer no que não cheira bem só faz piorar o odor. Se o Fulano em questão realmente não serve como amigo, o melhor é tomar uma medida amenizadora do mal-estar ou do mal-entendido surgido e depois promover um afastamento cordial.
A vida me ensinou que uma pessoa que não sirva para se conviver, alguém em quem não se possa confiar, é também uma pessoa com quem devemos evitar confusão, pois é doente (neurótica) ou de baixo nível.
O que é que você ganha discutindo com alguém? Algumas pessoas fazem isso porque andaram assistindo novelas e aprenderam a “não levar desaforo para casa”. Algumas dessas pessoas nem mesmo sabem conduzir um relacionamento de amizade ou conjugal sem estar todo o tempo a contender, como se a existência devesse consistir em um incessante defender-se dos outros e proteger seu território. Isso caracteriza um estrato cultural muito baixo. Pessoas educadas e elegantes não utilizam esse paradigma.